Pelo orifício do lóbulo da orelha da minha pequena criança índia, consigo enxergar enormes máquinas destruindo minhas florestas.
Vejo seres esbranquiçados, que exalam um odor de desejo insaciável, e que devoram com suas bocas malditas, toda a história capazes de alcançar.
Mim índio, era o dono do Brasil, e recebi os visitantes de peito aberto, mostrei meus rios, meu céu azul e minha inocência. Mim vivia em paz, cantava, dançava e pescava. Minha alegria, não se media.
Até chorar minha nação, e meu céu escurecer, por tantas maldades vividas e assistidas. Fui forçado a dar adeus à minha liberdade, e a conhecer a escravidão. Virei gente estranha em minha própria tribo. Um estrangeiro é o que sou.
Não me incomodo com suas grandes cidades, só não quero ser expulso do rincão que me sobrou, eu nasci aqui e não aceito vestir roupas, quero andar nu, em paz.
Tem muita terra, rio e mar, e não precisam da minha mata, onde planto pra viver.
Vou lutar ou até morrer pra minha terra defender, entoando os cantos dos espíritos dos animais, das árvores e dos meus irmãos mortos, vou no meu solo me sentar e fazer minhas malocas, cestarias, meu arco e flecha.
Guardo na minha língua estranha e desconhecida, os mistérios da vida e natureza que me cerca, sou uma lenda viva e inspiradora, portadora de espíritos milenares.
Fui traído em português, latim e por largos sorrisos que adoeceram o meu povo, matando meus irmãos. Éramos cinco milhões quando chegaram ensinando uma missa, nos escravizando e nos surrando para que esquecêssemos nosso Tupi.
Não me perguntaram se eu queria esquecer os meus rituais e minhas crenças, estavam em minha aldeia, eu era o dono da minha história, e de mim curumim.
O branco foi predador, e colocou irmão contra irmão, e hoje o que sobrou de nós está desorientado, entorpecido e desmoralizado, somos poucos, do Oiapoque ao Chuí…abobados.
Por ânsia de liberdade, meus irmãos suicidaram, fugiram para o mar, se perderam nas estradas dos brancos onde mendigam, mas eu fiquei pra lutar.
E quando eu ficar em eterno silêncio, não chorem por mim, vou viver em uma grande sucuri, mas deixo registrado que nunca precisarei de um dia. Eu sou imortal.
AF

AO PINDOBA, MEU IRMÃO TICUNA
Comentários
2 respostas para “AO PINDOBA, MEU IRMÃO TICUNA”
-
Falou seu lado indígena. Realmente os índios devem ficar indignados com esta invasão…
Como sempre: belo texto.-
É amiga Gina, de dna inclusive rsrs! Concordo, é o mínimo que os irmãos tupi merecem! Beijos e obrigada por seu elogio. Tenho orgulho de ter você assiduamente aqui comigo. Beijos
-
Deixe um comentário